Foto: sxc.hu

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Iconoclastia

Numa estranha melodia, juntavam-se: 


pretensa humildade filosófica, através da negação da detenção do conhecimento e até mesmo do conhecimento da realidade e a nada humilde pretensão sobre sua capacidade cognitiva e sobre o valor dos seus conceitos e opiniões.


Curiosamente, não parecia servir para mais do que fazer a taxonomia espiritual, que lhe punha valores de pretensa elevação... Como ironia recursiva, qualquer tentativa do famigerado ser de arranjar uma maneira de se desculpar depois de excomungar da sua religião qualquer ser que ele considerasse inferior, tornava-se inócua.


...e no final das contas, todo mundo veste o mesmo traje duro, não importando qual camisa ou saia nos vistamos, se cremos que saíremos dançando do traje ou que borbulharemos dentro dele.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Go!

Os vermelhos deslocavam-se no mais profundo breu dos corações azuis. Estes não tinham nem idéia do que estava acontecendo e foram surpreendidos com um ataque em cheio.

Se age-se como um vermelho, fica clara a famosa frase:
"Veni, vidi, vici"

A pior coisa é a estratégia em aberto.

domingo, 11 de julho de 2010

Se a vida é uma folha, o amor é uma pluma

Ofegante, tu correste, criança (pois é assim como se vêem os atos imberbes) por que tinhas medo que o fim da correnteza chegasse, que depois se concretizasse o maior dos pesos dos seres viventes, que o teu segundo coração sangrasse nas mãos erradas, que teu segundo coração achasse a falta de cores cinzeza de espírito, que... a poesia se confirmasse seca e fria...

Vieste transpirando e, sem querer (por que ninguém quer isso!), sopraste a pluma! Com tanto cuidado que carregaste e a pluma, que tu decoravas... voou!

E agora, vestes a fronte baixa, e se te ilumina, é da luz fraca da esperança já opaca, por tanto tempo intermitente a funcionar!...

Acorda-te!

Pois você não é mais o infante tal qual se imagina!

Acorda dessa letargia e considera que ainda não lhe chegou o maior dos pesos! Se agora dói seu peito, esteja feliz, por que as mais altas torres da felicidade erigem-se triunfantes sobre a chaga passada!


segunda-feira, 5 de julho de 2010

No Natal

Ela observava que a lâmina talvez estivesse meio gasta, até meio enferrujada... passou pela tua cabeça que, se o ato não se consumasse de maneira correta, ela ficaria ferida e também doente. Olhava lá fora as luzes piscando, parecendo até que elas estivessem zombando; ela enxergava até uma mensagem, lhe dizendo:

Hoje tu, logo logo passarás
E ninguém, ninguém mesmo, nem ligarás!

E pensava: todo amor, onde estás? Nos casais felizes, que vão de mãos dadas às compras, e imaginam que aquilo tudo nunca vai acabar: que seja infinito enquanto dure? Pois, Andréa, que ama José, que ama Maria, que ama Gunther, que ama Paul, que ama Hilde, no final das contas, se matam de amores, literalmente, ao bailar da fada verde?

Após as considerações do pré-ato, ela voltava a si, imaginando se alguém pararia para te olhar, lacrimejando o finzinho de luz que lhe sobrava, enquanto ainda palpitava... e concluía que, à parte de todo ato de comiseração ensinado pelos padres e pais e sei lá o que fosse, a vida continuaria bela, como também foi ensinado junto com as considerações sobre comiseração, culpa etc. E, ela imaginava como a encontrariam: triste, num quadro quase negro, com uma tantoo em mãos, quase que ainda tremulando, como se esse tipo de ato nunca se consumasse, dado à absurdez de presenciar um rosto meio deformado, mas jovem, pálido como a lua testemunha da cena final.

Trespassou impiedosa a velha poesia em metal todo o ventre: situação enigmática como um ponto final, seguiu mantendo a serenidade, como se a dor física acalmasse toda a dor espiritual que lhe dominava.

A noite caía como sempre.

sábado, 3 de julho de 2010

O barquinho

Era um barco pequeno.

Atravessava mares asiáticos e também, às vezes, alguns rios de águas mornas e leitos decorados com pequenas flores, como que parecendo pintadas após longos anos de trabalho árduo de algum artesão. Apesar disso, este barco vivia por si; nem lhe importavam os mares e os rios, em realidade, mesmo que sua finalidade objetiva fosse, simplesmente, de percorrer estes mesmos mares e rios...

Talvez, atracar à beira de um cais escuro e frio, sendo recolorido pela mescla da luz da lua e d'uma lamparina saudosa para ser retratado por algum pintor ainda lhe trouxesse algum brilho, mas ainda assim, o barco era por si só...

E nem que fosse inventada alguma teleologia para barcos: a não ser que assumissemos que sua finalidade era ser, no máximo que o hermetismo e a abstração permitissem, o protagonista não passaria de um amontoado de tábuas, metais e vidros.

É claro que, há de se convir, se não há portos almejados, basicamente se dirá que não portos para ir, mas apenas a necessidade de navegar.