Foto: sxc.hu

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Heráclito


Não há essência.

Há é construção constante,
no fluxo infindável da fugacidade inerente:
pelo menos enquanto houver crescimento...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Crença excessiva nos outros - Verborragias - parte I

Sei que somos na medida em que nos destacamos dos outros. Só somos enquanto conseguimos achar algo que diga que há uma diferença entre eu e os outros, que há um limiar, que há uma passagem, que em algum momento o outro representa algo que é estranho em mim. Descontado o fato de que isso pode parecer simplesmente apologia à segregação dos diferentes (mesmo por que, se agregamos os iguais, segregamos os diferentes, não há maneira. A identificação em grupo já é segregativa, desde que não são todas as pessoas iguais entre si.), sem isso não seríamos. Mas há de se considerar que há também um limite para essa necessidade de destaque: se há palavra a ser calada antes de sair da boca, assim deve ser feito. Quando digo que há palavra a ser calada, me refiro ao seguinte: elabore, fermente, jogue para cima, cheire, balance, torça, estique etc... as melhores palavras a serem ditas é aquelas que se podem fazer entender não somente no verbal! Um gesto, uma mímica, um desenho... o que se pode dizer só com a boca, não sei se vale a pena fazê-lo.

E por que digo tudo isto, pensam os que se prestaram a atingir este marco do texto: há necessidade de nos construírmos simplesmente à sombra do que todos os outros loucos que pairam sobre nossa cabeça dizem incessantemente, querendo que nos deformemos simplesmente sem nenhuma medida de melhora mas apenas de retorcimento da nossa personalidade? Vem a criança e vê o homem a olhar para cada moça que atravessa sua frente, produzindo pérolas para a literatura popular... a criança adquire o mesmo mote para construção de abordagem devido talvez a idéia que ela forma de que para se tornar homem, é preciso se encaixar dentro de um padrão definido por todos outros pertencentes àquela categoria... isso é razoável, no sentido prático para a criança, desde que ela precisa de algum ponto de referência... o problema é o espalhamento da atitude em todos os níveis da existência de outros seres humanos... por exemplo, numa dada matilha de adolescentes "machos", vê-se que pode ocorrer que cada um deles procure seguir algum "alfa"... E, isso, é oco, no sentido de você buscar crescer por seus próprios passos pois você vai estar dependente da instabilidade do sentido que foi imposto anteriormente pelo "chefe".

E tudo isto, é para aparecer; é destaque, mas não é "efetivo". Digo, o falar por falar, por exemplo, é besta.

O menino fala como o homem, chamando a moça ali de "gostosa", mas não compreende direito o que se diz... nem entende o que é cópula e muito menos toda complexidade das relações humanas que os adultos também facilmente se embaraçam... E faz por que ele é náufrago, um desesperado no mar de palavras proibidas, necessárias e inacessíveis... E aí que vê-se rapazes de vinte e tantos anos se metendo a falar asneiras como crianças, interpretando o papel de perdidos na verborragia, se afogando nas atitudes incompreendidas.

Há de se entender que não se está advogando por qualquer abundância de confiança, coisa cara à moda tosca que ronda os nossos dias, de querer ser o Sapiens correto, direto, que corta a ignorância, a alienação com sua lâmina flamejante da certeza, do bom senso; ele não chora, não titubeia, não erra e acredita em toda infinita bondade humana e o que mais há de se enxertar do mesmo modo como se entopem linguiças.

Se eu tentasse enfiar isso tudo numa caixa de fósforos, ficaria assim: buscar crescer na mesma medida que lhe atribuem altura, é fadar-se a ser anão.

*Critiquem, desçam o verbo! Senti vontade escrever incessantemente para ver como as idéias se acomodariam se elas fossem jogadas como roupas sujas dentro de um cesto, com pouquíssimo critério. Espero que pelo menos tenha havido clareza no que tentei atingir. Se acharem generalidades incompreensíveis, me façam sabè-lo, por que este texto serve bem também para saber a quantas anda a mentalidade de cá...

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Volúpia alheia

Ceci nest pas un chaussurre

Seu corpo exala um aroma impuro e pertubador.
Teu corpo é agora.

Escorre esguia entre os lobos, imaginando estar cumprindo somente seu desejo de prazer. Exercendo bem a promoção necessária para uma máquina hedonista ortodoxa, parecia esquecer-se a todo momento de que não havia somente ela a pairar sobre aquele mar de prazeres que gostava de fazer pensar que estava habituada... Curvavam-se perante seus dotes e isto bastava-lhe no teórico, sendo que no prático só tinha importância a consequência do teórico. Faltava a percepção do outro, faltava ver que não existia esse arder sem ar...

Regojizava-se aos olhos alheios, ao furor insano com o qual se atiravam sobre ela a cada movimento do estranho quadro ali conformado: pés pequenos sob um stiletto vermelho anunciando o perfume mesclado de suposto pudor, quase a explodir o elegante vestido de alvo-hipócrita, que se contorcia às provocações dos moços bêbados vulgares, com a própria vontade de arrebatar com um olhar e beijo ferinos os mesmos moços que talvez fossem tão sujos quanto a sua mente se rejubilava em imaginar que o deixar-se tomar pela devassidão permitiria.

Quixotescamente, erguia-se sobre si mesma de moinho à gigante, enquanto dominadora, como se fossem suas incapacidades de sentir profundamente e de amar sem saber amar, um mero personagem cavaleiresco de um conto de Cervantes, sem perceber que nisso, ela se constituía num fantoche da sua própria angústia de não conseguir e de nem saber o que ela desejava para si.

Apesar de necessitarmos do outro,
há sempre a necessidade de surgirmos por nós mesmos sobre nossos pés.