Foto: sxc.hu

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Legado

Com o seu falecimento hoje às 2 da manhã,

decretou-se o tempo inexistente.
decretou-se, no fundo da minha alma, que, apesar das diferenças, passou como aquele que, por algum momento, apoiou-se à beira da correnteza inevitável e invencível, e pode vislumbrar o rio de outra maneira, e que, por muita sorte, me chamou enquanto à mesma beira para mirar o rio.

Brilhou e ofuscou minha visão. Visão nascida míope, fisicamente por ascendentes, inevitavelmente por existir.
Ofuscou e me fez relembrar que a miopia descendida é uma banalidade genética e corrige-se de modo igualmente banal. Fez-me relembrar que a miopia da existência, não se corrige, mas se faz da mesma maneira quando não conseguimos corrigir a superficialidade física: estreitamos os olhos, olhamos para um ponto, fixamos bem nele, paramos detidamente, tentando ultrapassar a dificuldade de ver usando da imaginação e do raciocínio... ou então, chegamos cada vez mais perto dele, e, agindo como uma criança, olhamos por muito tempo, cheiramos, viramos, jogamos e o que mais for necessário para o objeto se curvar à petulância infantil da qual nos dotamos.

Apesar das diferenças, ele veio e ficou. Acima das futilidades de lembrar de sua aparência, status social ou qualquer outra tolice deste gênero, ficou o seu jeito de fugir da miopia, de apoiar-se à margem da correnteza e dizer:

"Apesar de tudo, acho que estamos um pouco mais perto do começo do rio do que os que se deixaram arrastar."

domingo, 2 de maio de 2010

Desilusões: IV - Crepúsculo da vontade

Era um rapaz com 26 anos. Pretensões de querer de alguma forma mudar as pessoas permeavam boa parte das suas idéias: desejava que as pessoas se educassem, para que elas mesmas buscassem resolver seus problemas sem precisar da mão estendida a oferecer a ajuda fundamental, tanto para resolver quanto para minar cada vez mais as chances de crescimento daquele que se ajudaria através da rancificação da vontade própria do mesmo.

Mas, talvez, as idéias, com o tempo, começariam a soar opacas e amareladas, quase se fundindo ao fundo da gaveta e àquelas lembranças vagas, com cheiro de grama da infância... Agora, provavelmente, ainda haja um reluzir, como um velho relógio que tenha parado, mas que talvez, seja boa parte de um passado coerente e nada mais que isso...

Parece que não só as células que se degeneraram, mas também a esperança. Quiçá haverá de vir a próxima geração para soprar o pó acumulado por comodidade sobre as esperanças, para bradar o estandarte da vida e tentar amanhecer a geração anterior para novas idéias e novas esperanças.